sábado, 24 de março de 2012

Por que tantas Religiões?

Por que existem tantas religiões? Como podemos encontrar a religião certa? Alguém já pensou procurá-la nas páginas amarelas da lista telefônica? Recorremos à lista para muitas coisas, mas essa reposta não encontramos lá. Nosso objetivo é a verdade. A verdade não está à venda. Em certas páginas amarelas podemos encontrar colunas e colunas de igrejas, mas como alguém poderá escolher acertadamente em meio a tantas opções?

Você teria coragem de fechar os olhos e correr o dedo por uma página e escolher por acaso aquela igreja onde seu dedo parasse? Certamente, ficaria confuso, porque a questão parece ir muito além das páginas amarelas. Estamos vivendo em uma época de mudanças radicais. As igrejas, por sua vez, na tentativa de mostrar interesse pelo povo, envolvem-se com a ação social, a política, a guerra e a pobreza. Enquanto isso, o Evangelho de Cristo tem sido colocado de lado.
O que tem ocorrido nos últimos tempos é uma deterioração dos valores morais. Cercados pelas dúvidas, há os que pensam em se desligar das igrejas, por considerá-las desnecessárias. E quanto aos caminhos diferentes, inovadores, será que são guias seguros na procura da verdade? Por causa disso tudo, muitas ovelhas desgarradas (como define o Evangelho) estão voltando ao rebanho. E muitas ainda permanecem em dúvida. Você pode ser uma dessas pessoas. A dúvida pode estar atravessada em seu caminho.
Se seu desejo é exclusivamente encontrar a verdade sem subterfúgios, você não irá à procura de uma igreja pela altura de suas torres, pela riqueza de seus altares ou pela elegância de seus adeptos. Existem milhões e milhões de pessoas que se proclamam cristãs. Ela acreditam no cristianismo, opondo-se ao hinduísmo, budismo, islamismo ou judaísmo. Mas, além do vago rótulo de cristãs, não há mais semelhanças.
Cristãos e igrejas cristã parecem ir à procura de todo o tipo de variedades. Você está procurando uma organizacão grande, com muitos milhões de adeptos, ou um pequeno e discreto grupo? Uma igreja antiga ou uma igreja nova? Alguns escolhem uma igreja apenas porque ela está ali na esquina. Outros consideram a amizade muito importante. Há os que são atraídos pela música de um grande órgão ou pelo canto de um coral, ou procuram um pastor simpático e carismático. Poucos, muitos poucos, dão qualquer importância, ou qualquer prioridade, à verdade.
A verdade é o fator mais importante. Deus coloca a verdade à nossa frente. Vamos ver o que Ele diz através do profeta Isaías (VT) 8:20: "A Lei e ao Testamento! Se eles não falarem segundo esta palavra, nunca verão a alva." Sem a luz que brilha da Palavra de Deus, não chegaremos ao pleno conhecimento da verdade.
A Bíblia dá uma resposta muito clara e compreensível: "E viu-se um grande sinal do céu: uma mulher vestida do sol, tendo a lua debaixo dos seus pés, e uma coroa de doze estrelas sobre a sua cabeça. E estava grávida, e com dores de parto, e gritava com ânsias de dar à luz." Apocalipse (NT) 12:1 e 2.
A mulher, na profecia bíblica, significa Igreja. Deus usa com freqüência o símbolo de uma mulher para representar a Igreja. Uma mulher pura e bonita representa a verdadeira Igreja. E uma mulher prostituta representa uma igreja falsa. Tendo isso em mente, entenderemos a profecia. Quando algumas pessoas lêem o livro do Apocalipse, exclamam:
- Que coisa horrível! O capítulo 17 fala sobre prostituta!
é bom, entretanto, que você compreenda bem a linguagem bíblica e saiba que o profeta não está se referindo à impureza física. Na verdade, "a mulher vestida de púrpura e de escarlate" ( Apocalipse 17:4) representa uma igreja falsa, infiel ao Senhor. Não se esqueça de que o Novo Testamento fala também da Igreja como a noiva de Jesus. A Igreja aí é, também, simbolizada por uma mulher e Cristo é seu noivo. O caráter da mulher, no Apocalipse, simbolizava a Igreja verdadeira e a igreja falsa.

Continuando a leitura de Apocalipse (NT)12:3 e 4, João descreve: "E viu-se outro sinal no céu; e eis que era um grande dragão vermelho que tinha sete cabeças e dez chifres, e sobre as suas cabeças sete diademas. E a sua cauda levou após si a terça parte das estrelas do céu, e lançou-as sobre a terra; e o dragão parou diante da mulher que havia de dar à luz, para que, dando ela à luz, lhe tragasse o filho”.
O dragão é inquestionavelmente Satanás, o anjo caído que levou um terço dos anjos com ele na rebelião. O dragão estava diante da mulher, ou da Igreja, para devorar Seu filho tão logo Ele nascesse. Vamos recordar que Satanás, através de Herodes, o governador romano, tentou destruir a Cristo decretando que todas as crianças do sexo masculino encontradas em Belém fossem mortas. Mas Satanás não foi bem-sucedido.
Vejamos o versículo 5: "E deu à luz um filho., um varão que há de reger todas as nações, com vara de ferro; e o seu filho foi arrebatado para Deus e para o seu trono." Jesus está a salvo, ao lado do Pai. Mas Satanás não desistiu. Após fracassar na tentativa de destruir Jesus, voltou sua atenção para a mulher, a Igreja, e determinou destruir Seu povo. Isso é o que está retratado com clareza nas Escrituras.
O versículo 6 esclarece que "a mulher fugiu para o deserto, onde já tinha lugar preparado por Deus, para que ali fosse alimentada durante mil duzentos e sessenta dias." A Igreja, atacada por Satanás, passou momentos terríveis. O período de perseguição durou 1260 dias proféticos, cada dia simbolizando um ano literal. A Igreja fugiu para o deserto porque ela precisava de segurança contra a incansável perseguição, que começou logo depois da morte dos apóstolos e iria aumentar no domínio de Justiniano I, no ano 527 da nossa era.
Justiniano oprimiu a verdadeira Igreja - a primitiva - retirando toda a proteção dos que chamava de dissidentes. Os cristãos passaram a ser perseguidos pelo simples crime de permanecerem leais à Palavra de Deus. Essa opressão atingiu sua incontrolável fúria no ano 538. Esse número somado a 1260 nos leva a 1798. Após quase 13 séculos no deserto, Deus impediu que Sua Igreja fosse extinta. Agora observe o que diz o versículo 14: "E foram dadas à mulher duas asas de grande águia, para que voasse para o deserto, ao seu lugar, onde é sustentada por um tempo, e tempos, e metade de um tempo que representam o mesmo período de 1260 anos”.
De acordo com o versículo 16, "a terra ajudou a mulher". Nas montanhas, nos lugares mais afastados, a mulher (a Igreja) se protegeu contra os ataques de Satanás e assim sobreviveu. Logo em seguida, a vemos vitoriosa. E ela permanece assim até o final dos tempos. E chegamos ao versículo 17 do capítulo 12: "E o dragão irou-se contra a mulher, e foi fazer guerra ao resto da sua semente, os que guardam os mandamentos de Deus, e têm o testemunho de Jesus Cristo."
Vamos relembrar o que estudamos até aqui. o apóstolo João, o revelador, viu uma bonita mulher representando a Igreja verdadeira de Jesus Cristo, em pé nos céus. Estava grávida, esperando um filho. Uma coroa de 12 estrelas adornava-lhe a cabeça. A Igreja, como se vê, com a coroação de glória dos 12 apóstolos, encontra-se sobre a lua, que não tem luz própria e apenas brilha com luz emprestada. Esse foi o princípio da era cristã. A lua simboliza as sombras e cerimônias do Velho Testamento, que passaram para sempre com o sacrifício de Cristo.
A mulher vestida com o fulgor do sol, ou seja, com o brilho do Evangelho, projetou-se para o futuro. Seu filho foi perseguido pelo dragão, e permanece finalmente a salvo no Céu. A Igreja tornou-se o alvo da perseguição por 1260 anos. Apesar de toda esta fúria destrutiva, ela está viva em nossos dias, consolidada na fé de Jesus e nos mandamentos de Deus.
Durante nosso estudo, quando utilizamos a palavra igreja, não pensamos em nenhuma denominação religiosa. No Novo Testamento, o termo Igreja significa a sociedade religiosa fundada por Jesus Cristo. Seus adeptos são, portanto, os escolhidos de Deus. é muito confortante saber disso, você não acha?
E quanto à predição? Ela se cumpriu? Perfeitamente. Uma tremenda avalanche de perseguição foi desencadeada contra os seguidores de Cristo. Começou com Nero, mais ou menos na época do martírio de Paulo. Os cristãos foram falsamente acusados dos mais hediondos crimes, inclusive de calamidades naturais e terremotos. Muitos foram atirados às feras ou levados às fogueiras, sendo alguns até crucificados.
Mas não ficou só nisso. A perseguição continuou. Entretanto, os cristãos permaneceram firmes. Os que deram a vida à causa de Cristo foram substituídos por outros igualmente leais. Satanás viu que não poderia destruir a Igreja pela violência e resolveu tramar outros métodos: agir em silêncio e trabalhar dentro da Igreja. Como lobo vestido com pele de cordeiro, sua tática colocou a Igreja em tremendo perigo. A concessão tornou-se uma arma mais eficiente do que a morte.
A Igreja, com a pretensão de ser popular, cortejou o mundo. Pagãos em grande número trouxeram seus ídolos, superstições e cerimônias. A popular Igreja visível estava agora corrompida. Não podia mais ser representada pela mulher bonita e pura de que nos fala Apocalipse 12. O pequeno núcleo de cristãos que se mantivera firme, seguindo a Cristo e aos apóstolos, jamais poderia aceitar a heresia e a corrupção. Só lhe restava uma opção: esconder-se, fugir para o deserto, como estava perdido.
Durante toda a Idade Média, por quase 13 séculos, a Igreja teve que permanecer com seu pequeno núcleo de fiéis escondido. Somente Deus sabe quantos foram martirizados naqueles anos terríveis. A perseguição já não vinha de fora. Eram cristãos perseguindo outros cristãos. Foram praticadas as maiores atrocidades em nome da religião. Parece que não existe algo tão terrível como o terror praticado em nome de Deus. Mas através de toda a Idade Média a luz da fé e da esperança jamais se apagou.
As ameaças, os riscos e a própria morte não foram suficientes para apagar a chama viva da verdade conforme a experiência vivida pelos valdenses, em 1655. Eles estavam reunidos na "Chiesa de la Tanna", a Igreja da Terra, onde por muitos anos cantaram, oraram e compartilharam seu testemunho destemido. Um dia, porém, 250 deles foram surpreendidos naquela caverna. Os soldados fizeram uma fogueira na única entrada existente. Enquanto o oxigênio era consumido, eles cantavam louvores a Deus até terminar o fôlego, até a hora da morte. John Milton, o poeta cego, autor do célebre poema "Paraíso Perdido", impressionado com o martírio sofrido por esses heróis, escreveu:
"Vingai, ó Senhor, Teus santos trucidados, cujos ossos jazem espalhados pela fria montanha alpina, aqueles que mantiveram Tua verdade pura, quando nossos pais adoravam pilares e pedras.

Mas a tocha da verdade nunca foi totalmente extinta e, em 1798, chegou ao fim o período dos 1260 anos. Na maior parte da Europa, a perseguição havia cessado 25 anos antes. Jesus havia dito que, "se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria." O Movimento de Reforma havia cumprido seu papel. Os tradutores da Bíblia tinham concluído seu trabalho. As impressoras estavam publicando as Escrituras para serem espalhadas pelo mundo e se tornar disponível para todos.
A Igreja primitiva, a verdadeira igreja, a mulher de que nos fala Apocalipse 12, nasceu no início da era cristã e representa a fé inabalável de Jesus Cristo em toda a sua pureza. Ela prossegue através dos séculos.
é como se ela tivesse entrado no túnel par atravessar os séculos. Procurou esconder-se. Desapareceu durante um período de 1260 anos, tal como previa o apocalipse, e saiu do túnel em 1798, com os estigmas e as marcas de seu longo sofrimento, mas como guardiã da verdade, ainda resplandecendo a pureza da fé recebida de Jesus e dos apóstolos.
Você já imaginou quanta confusão causaria se desse túnel não saísse uma única e verdadeira Igreja, mas 212 ramificações da fé cristã, com diferentes denominações, credos e ismos, uma contra a outra na maioria das vezes? Certamente você diria, com justa razão, que alguma coisa aconteceu no túnel do deserto. Mas as verdades de Deus, fielmente seguidas, apesar de toda a perseguição, devem ter voltado também do deserto.
Não há dúvida de que a Igreja verdadeira sobreviveu em seu longo afastamento. Mas como podemos saber qual a verdadeira Igreja hoje, em meio a tantas denominações?
Como iremos distinguir a verdadeira da falsa? Acreditamos que devemos avaliar a Igreja como Deus o faz. Ele mede uma Igreja por sua reação à verdade. E Ele nos mede do mesmo modo. Ninguém pode dizer que sua Igreja é a única que será salva no final, porque Deus salva as pessoas, individualmente, e não as Igrejas. Portanto, meça a sua Igreja pelo que ela ensina como verdade.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Salmo 23 no original hebraico. Qual amelhor tradução ?

Em minha devocional diária, estou fazendo um estudo sistemático comparativo entre versículos "clássicos" nas traduções mais recentes da Bíblia e traduções originais do hebráico e grego, achei algo muito rico e quero compartilhar. O salmo 23 nas versões contemporâneas diz "O Senhor é meu pastor e nada me faltará...", e já nos originais se lê "O Senhor é meu pastor e DE NADA SENTIREI FALTA", faz muita diferença. Em um se lê que Deus sendo meu pastor terei todas minhas necessidades supridas, terei meus desejos atendidos, na outra versão você entende que Deus sendo meu pastor eu não entirei falta de mais nada, pois já terei o mais importante, Ele.

Não sentirei falta de coisa alguma: como deu pra perceber, buscamos uma tradução mais fiel ao original. Ora, a tradução que temos em nossas Bíblias pode ser interpretada na perspectiva da prosperidade, onde as pessoas acham que irão ter tudo o que querem ou desejam, mas não é assim. O texto quer nos informar que, quando estamos em plena confiança e segurança no Deus-pastor, temos a satisfação de todas as nossas necessidades, ou melhor, não sentimos falta de coisa alguma. A presença de Deus nos satisfaz e nos ajuda a vencer o tempo mau.

O Salmo 23 tem sido um dos mais famosos textos da Bíblia através dos tempos. Nas palavras contidas nele muitos tem encontrado conforto e encorajamento em momentos de adversidade, crises matériais ou existenciais. Composto por Davi, a poesia evidencia a experiência pastoril, e reflete com genialidade a vivência do Rei como pastor de ovelhas e sua relação de dependência de Deus, como ele via o cuidado do Senhor para com seus filhos.

A experiência humana atravessa na atualidade a era dos sentidos, isto é, um momento de supervalorização das sensações e da satisfação. Busca-se, acima de tudo, a resolução dos problemas através dos caminhos que as pessoas julgam ser melhor, e a religião não está livre de ser enquadrada nessa mentalidade tornando-se um manual de receitas. A grande questão com a qual as pessoas confrontam a fé é: “De que forma isso pode resolver meus problemas?” Deus nesse contexto foi reduzido à função de ser a fonte de satisfação para os descontentamentos materiais e psicológicos.

O existencialismo abarca grande terreno exatamente por encontrar um campo fertilizado pelas demais formas de pensamento que juntas compõem o tecido ideológico da pós-modernidade. Uma maneira de pensar aprisionada a um presente perpétuo em que não basta satisfazer os sentidos, tem que ser imediatamente.

Assim, trechos das Escrituras que denotam conforto, encorajamento e promessas de prosperidade adquirem caráter especial e passam a ser usados com muito mais freqüência do que aqueles que mais diretamente falam sobre transcendência, arrependimento, reforma ou santificação.

“O Senhor é meu pastor e nada me faltará” nesse contexto é, portanto, a jóia da coroa das teologias existencialistas. O primeiro verso do Salmo 23 indicando satisfação das necessidades é a sedução escrita para aquele que procura o Pastor para redimi-lo das agruras de um mundo rico em necessidades e pobre em recursos. A solução dessa inviabilidade crônica experimentada pelo homem pós-moderno pretende estar nas palavras: “nada me faltará”.

SALMOS, LITERATURA SAPIENCIAL E EXISTENCIALISMO PÓS-MODERNO
Os Salmos são uma coleção de hinos hebraicos e orações de vários autores. Uma característica marcante deste tipo de literatura é a sua forma de construção completamente distintiva. É possível perceber em toda a Bíblia o objetivo de Deus, que é comunicar-se com a humanidade. Nos Salmos e na literatura sapiencial essa comunicação é feita através dos homens de uma forma diferente das demais na Bíblia em que o Espírito Santo utilizou os profetas. Obviamente a inspiração é a mesma, mas enquanto nas demais partes da Escritura os homens falam “da parte de Deus”ou melhor, em nome de Deus, os Salmos primariamente contém palavras faladas para Deus ou acerca de Deus . É uma comunicação dos homens entre si expressando as suas impressões do Criador na dinâmica da vida humana. A maior parte da linguagem dos Salmos é intencionalmente emotiva .

Essa característica nos é particularmente importante porque sendo muitos Salmos poemas musicais eles exigem cuidado especial quando interpretados. A sua linguagem é grandemente metafórica, neles se deve procurar o objetivo da ilustração e não se deter no significado literal .

Olhar para um texto implica em saber o que ele queria dizer para o destinatário primeiro a quem ele foi escrito. O pesquisador deve localizar e, se possível datar o que tem em mãos, conscientizando-se do contexto vivido pelo autor, mas é inegável que as exigências práticas que dão suporte a toda interpretação adquirem sempre um caráter contemporâneo, pois mesmo que a passagem bíblica possa parecer remota no tempo e sob um contexto cultural completamente diferente, a busca foi motivada por uma situação ou necessidade do presente, onde realmente os acontecimentos transportados pelo pesquisador tem significativa vibração. A religião pós-moderna, obviamente, tem características diferentes da vivenciada pelos hebreus na época de Davi. A mentalidade grega que influenciou o mundo a partir do helenismo ainda subjaz na construção do pensamento atual; a busca pelo sensacional, prazeroso e extático domina o pensamento religioso, principalmente no pentecostalismo; o homem pós-moderno quer uma receita, uma forma de resolver seus problemas, ideologia que não era comum a Davi.

Embora o Salmo 23 seja curto e relativamente livre de problemas textuais e de tradução, ele é, não obstante, difícil de interpretar no que diz respeito a questões como contexto social e cultural. A maior discussão entre os comentaristas se dá sobre o cenário que ele se desenvolve e o propósito litúrgico do salmo.

Os primeiros quatro versos claramente relatam a vivência pastoril aplicando a relação com Deus, o supremo pastor. O cuidado e a dependência são a tônica principal. A partir do verso seis, o cenário aparentemente se transforma: um banquete, unção, templo. E, embora muitos interpretem a segunda parte do Salmo também num contexto pastoril não há consenso nem evidência suficientemente clara de que seja de fato assim.

Então, deve-se considerar que o Salmo precisa ser visto como um todo no seu contexto, mesmo que nada comum a realidade vivida no ocidente pós-moderno é essencial para compreender a aplicabilidade do texto.

NADA ME FALTARÁ

Os primeiros versos do Salmo 23 dizem:

“O senhor é meu pastor e nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me Mansamente às águas tranqüilas. Refrigera a minha alma. Guia-me pela vereda da justiça por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum porque Tu estás comigo; A tua vara e o teu cajado me consolam.”

O salmista usa um recurso muito comum dos Salmos que é a figura de retórica. A metáfora neste recurso é a descrição de uma coisa em função de outra. A comparação está meramente subentendida. O Senhor (יהוה) é chamado de Pastor. A metáfora neste ponto conecta a um dos mais antigos epítetos de Deus na tradição hebraica (Gn 49:24) e que também tem paralelos nas religiões do Oriente Próximo . Yahweh é descrito como pastor metaforicamente também no Salmo 80:2, 77:20 e 95:7 e conota um atributo de guia do seu povo. Davi não é, portanto, o Criador desta comparação, ele usa deste antigo cognome de Deus como ponto de partida e a partir dele desenvolve a metáfora em que aplica a sua experiência pessoal enfatizando o cuidado de Deus .

Nesta primeira divisão do salmo existe uma descrição do caráter de Deus como: um Deus pessoal e que estabelece uma relação de pertencimento com os seus filhos (meu pastor); soberano e proprietário do seu povo – esta compreensão está implicitamente compreendida devido à forma que o epíteto foi usado através dos tempos; ele é o guia que dirige os seus, coletiva e individualmente; ao dizer “refrigera a minha alma”, o salmista faz uma conexão com experiências de Israel e os momentos difíceis que passaram ao longo de sua história, bem como a própria vida de Davi como rei líder militar, é o retrato de um Deus que conforta e faz de todas as experiências impulsos para a santificação (guia-me pela vereda da justiça).

Assim, embora o salmo seja experiencial o salmista não insiste em dizer da pecaminosidade e estupidez dos homens, ao invés disso enfatiza o caráter de Deus como todo-suficiente, soberano, cuidadoso e redentor. Esta constatação o leva a concluir que com ele “nada faltará”.

O Sentido Etimológico do Texto

A expressão traduzida como “faltar” ou “faltará” origina da palavra hebraica 'echsâr (אחסר) e incide no Antigo Testamento também como “necessidade” (Dt 15:8) ou “insatisfação” (Pv 13:25). A Nova Versão Internacional traz a expressão “nada sentirei falta” ('echsâr). E a versão inglesa King James diz: “I shall not want” que em português poderíamos dizer “não desejarei” no sentido de querer.

A partícula de negação lô (ל۬,) pode também ser traduzida como “não; sem; nenhum; nada” . De forma que, a tradução pode variar entre “nada faltará”, “nada desejarei”, “não terei nenhuma insatisfação”.

Neste sentido, o Senhor é meu pastor e eu não sentirei falta de mais nada, é uma metáfora ampliada ou uma alegorização que fala de Yahweh não somente como provedor ou aquele que satisfaz as necessidades, mas um ser que é tudo em essência. O salmista diz ter o pastor – e isso revela o desejo da ovelha pela pessoa do pastor, mais do pelo conforto que ele proporciona – não sentirei falta de nada, ou nada mais desejarei porque pastor é “todo-satisfação”.

O quinto verso sugere uma mensagem de transcendência que não pode ser dissociada do restante do salmo: “preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos” esta frase projeta (também) a um acontecimento futuro, escatológico. Igualmente no último verso, as palavras “habitarei na casa do Senhor para sempre”.

O epíteto não aparece substancialmente cotado no Novo Testamento, não obstante, ele está relacionado com a compreensão das figuras de linguagem dos Evangelhos. Quando Jesus disse: “Eu sou o bom Pastor. O bom Pastor dá a vida pelas suas ovelhas.” (Jo 10:11). Ele não estava meramente utilizando uma metáfora familiar para os seus expectadores a partir do conhecimento que tinham das Escrituras, mas fazendo uma clara alusão à sua personalidade divina, uma vez que não apenas no Salmo 23 mas em outras passagens em que a metáfora é empregada, Deus é o pastor. Além disso, Jesus conduziu seus ouvintes a uma leitura do Salmo 23 na perspectiva da razão primeira de toda a Bíblia: o plano da salvação. Nas palavras do comentarista Peter Craigie: “O eco do êxodo e a redenção do Egito no salmo são transformados em ecos de redenção efetuada pelo pastor que se propôs a entregar a sua vida pelas suas ovelhas”.

Jesus fornece a sua igreja no Novo Testamento a compreensão de que o seu sacrifício salvífico é completo, abundante e abrangente, a leitura sob esta luz do primeiro verso do salmo 23 nos diz o Senhor é o pastor e nele a salvação é completa.

Na interpretação dos Salmos e da literatura sapiencial das Escrituras precisamos usar os mesmos princípios que usamos em outras partes dela. A análise lingüística e contextual, como também o estudo dos antecedentes no que concerne ao texto ou a uma passagem elucida as questões levantadas pelo próprio texto e impede a queda em possíveis equívocos. Além disso, uma boa observação de como os profetas, apóstolos e Jesus se referem ao texto ajuda perceber a amplitude de aplicação da passagem.

É importante ainda ter a consciência do caráter dos escritos. Salmos são cânticos, portanto, é a expressão de alguém, conforme já foi dito, falando sobre Deus. Como os cânticos atuais, as suas palavras não podem ser simplesmente compreendidas como normativas ou promessas infalíveis, porquanto também falam do caráter daquele que escreve quando este tenta exprimir o caráter de Deus.

Assim ao nos deparamos com frases como: “feliz aquele que pegar os teus filhos e der com eles nas pedras” (Sl 137:9) evidentemente não podemos interpretar como sendo esta uma expressão de Deus, mas a angústia e revolta dos oprimidos de Israel em relação aos seus opressores.

Obviamente, é um erro concluir que os Salmos e a literatura sapiencial não são inspirados ou contém um grau inferior de inspiração, ao contrário, são tão plenamente inspirados quanto os outros texto das Escrituras, porém, a mensagem de Deus revelada neles se dá em uma estrutura literária diferenciada. Podemos dizer que a face de Deus neles se revela como por espelho, nas expressões dos homens.

O Salmo 23, no primeiro verso transmite o testemunho do cuidado de Deus, revela um cuidadoso e diligente ser que se dedica a segurança e subsistência daqueles que estão sob seus cuidados.

O problema incide na redução dos atributos de Deus, descritos no Salmo a um simples provedor de suprimento para as necessidades imediatas e temporais. Quando a compreensão de Deus é adaptada ao ideal predominante do momento histórico ele adquire caracteres de homens, de forma que, quando este busca transcendência se deparará com um ser tão parecido com a humanidade que ele não o julgará capaz de ajudá-lo.

A teologia existencialista lê o Salmo 23:1 enfatizando o presente, ignora que quem compôs o Salmo foi Davi, relatando a sua experiência com Deus. Suas palavras neste sentido não são uma promessa, antes, um testemunho.

Com base nos dados levantados nesta pesquisa concluímos que as palavras na língua original empregada permitem a leitura mais ampliada do texto significando que a mensagem da expressão ”nada me faltará” é mais abrangente do que a popularmente compreendida aproximando muito mais de “nada mais desejarei”, isto é, a satisfação da ovelha quanto ao seu pastor enquanto pessoa.

Jesus é o Pastor, ele mesmo disse. Ele é o Pastor do Novo e do Velho Testamento. Associando a sua declaração confirmada na cruz com o que o salmista disse, leremos: “o Senhor é o meu pastor”, “o bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas”, certamente como ovelhas de Jesus, o desejamos, e nada mais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Timm, Alberto R. “Antecedentes Históricos da Interpretação Bíblica Adventista” (ed.) George W. Reid. Compreendendo as Escrituras. Engenheiro Coelho-SP: Unaspress, 2007.

Volz, Carl A. The Medieval Church: From the Dawn of the Middle Ages to the Eve of the Reformation. Nashville: Abingdon Press, 1997.

Zuck, Roy B. A interpretação Bíblica Hoje. São Paulo: Vida Nova, 1997.



Outra Tradução

Texto Hebraico Transliterado :
" Iahvéh ro’i lô echsar. Binôt deshé iarbitseni ‘al-mei menuchôt inahaleni. Nafshi ishovêv iancheni bma’ glei-tsedék lema’an shemô. Gam ki-eléch beguei tsalemavet. Lô-iirá roa’ ki ata ‘imadii shvtechá umishi’antechá hemá inachamuni. Ta’arôch lefani shulchan neguéd tsorerai dishantá vashemén roshi kossi revaiáh. Ách tôv vachéssed irdefuni kôl-imei chaiai veshavti beveit-Iahvéh leoréch iamim "

Tradução

“ Adonai é meu pastor, não me faltará. Em verdes pastagens me fará descansar. Para a tranqüilidade das águas me conduzirá. Fará meu espírito voltar ou retornar, e me guiará por caminhos justos, por causa de Seu nome. Ainda que eu caminhe pelo vale da morte, não temerei nenhum mal, pois Tu estarás comigo. Teu bastão e teu cajado me confortarão. Diante de mim prepararás uma mesa, na presença dos meus provocadores. Tu ungirá a minha cabeça com óleo; minha taça transbordará. Certamente, bondade e benevolência me seguirão, todos os dias da minhas vidas. E voltarei na casa de Adonai por longos anos.”

A Bíblia é sem dúvida o mais “rico” dos livros, curiosamente ostenta o título de ‘o mais vendido (está em todas as casas) e o menos lido’.

10 RAZÕES POR QUE O CRISTÃO NÃO DEVE SE ALIMENTAR COM CARNES IMUNDAS

1 - Porque a divisão de animais limpos e imundos procede de ANTES da legislação mosaica, desde o tempo do dilúvio, quando Deus determinou a Noé: “De todos os animais limpos levarás contigo sete e sete, o macho e sua fêmea; mas dos animais que não são limpos, dois, o macho e sua fêmea” (Gên. 7:2). Assim, fica claro que não era regra exclusivamente voltada ao povo de Israel, limitada à legislação mosaica.

2 - Porque os objetivos da proibição divina visam à melhor saúde do povo escolhido: “Se ouvires atentamente a voz do Senhor teu Deus, e fizeres o que é reto diante de seus olhos, e inclinares os ouvidos aos seus mandamentos, e guardares todos os seus estatutos, sobre ti não enviarei nenhuma das enfermidades que enviei sobre os egípcios; porque eu sou o Senhor que te sara” (Êxo. 15:26). Em Deuteronômio Deus liga a santidade de vida com as restrições alimentares impostas ao Seu povo: “Porque és povo santo ao Senhor teu Deus, e o Senhor te escolheu para lhe seres o seu próprio povo, acima de todos os povos que há sobre a face da terra. Nenhuma coisa abominável comereis” (Deu. 14:2, 3) .

Os animais imundos, como porcos, cobras, lagartos, urubus, ratos, cumprem sua função ecológica, mas são portadores de enfermidades e apresentam outras problemas que os tornam insalubres para alimentação humana, como autoridades médicas têm constatado.

3 - Porque o profeta Isaías, num texto escatológico (referente ao fim de todas as coisas), fala de condenação da parte de Deus aos consumidores de carne de porco e rato, que associa com cultos pagãos, chamando a tudo isso de ABOMINAÇÃO: “Os que se santificam, e se purificam para entrar nos jardins após uma deusa que está no meio, os que comem da carne de porco, e da abominação, e do rato, esses todos serão consumidos, diz o Senhor” (Isa. 66:17). A Ezequiel Deus também condenou tal tipo de alimento e o profeta expressou sua repulsa pelos mesmos (ver Eze. 4:13, 14).

4 - Porque temos o exemplo bíblico de um herói da fé que preferiu a morte a consumir carne de porco, como citado em 2 Macabeus 6:18-31: Eleazar preferiu morrer a consumir carnes proibidas, “deixando, por sua morte, não somente aos jovens, mas à grande maioria da nação, um exemplo de nobre coragem e um memorial de virtude” (vs. 31--Traduction Oecumenique de la Bible). Embora isto seja de um livro apócrifo, é importante fonte de informações históricas e lança muita luz sobre os usos e costumes judaicos ao longo de séculos e milênios de apego às ordens divinas, pelos fiéis.

5 - Porque as leis de higiene e saúde não tinham caráter prefigurativo. Não eram leis “cerimoniais” e não apontavam à expiação de Cristo na cruz. Os debates de Cristo quanto a questão “do que entra pela boca”, muitas vezes mal compreendidos, diziam respeito a regras de impureza cerimonial, e não de discussões sobre liberdade para alimentar-se de comidas imundas, nem de recomendação de “comer sem lavar as mãos”, o que não seria medida recomendável, do ponto de vista médico.

6 - Porque na visão do lençol, de Atos 10, Pedro declarou que de modo algum consumiria animais imundos, como lhe apareceram num simbolismo dos gentios, os quais eram desprezados como “comuns ou imundos”, pelos judeus (ver Atos 10:10-16, 28 e 34). Portanto, ele demonstra que não aprendeu com Jesus ou seus companheiros apostólicos a alimentar-se daqueles animais.

7 - Porque entre as quatro regras determinadas pelo Concílio de Jerusalém (Atos 15) de questões de que os cristãos gentios deviam ABSTER-SE, embora sejam citados o consumo de sangue e carne sufocada, não se estabelece regra sobre coisas de que não havia necessidade de esclarecimento. Todos já sabiam que as carnes proibidas não eram alimentos válidos para o consumo dos cristãos. Paulo não tratou dessa questão ao discutir o problema das “carnes sacrificadas a ídolos” (1 Cor. 8’). Caso ele quisesse indicar o fim das leis de restrições alimentares, valer-se-ia da ocasião para tratar disso, e jamais o fez. O que ele dizia era que não haveria preocupação com esse tipo de carnes por terem sido sacrificadas a ídolos pois “o ídolo em si nada é”. Os sacerdotes pagãos vendiam parte das carnes de seus sacrifícios para consumo público. Mesmo que também sacrificassem coisas tais como porcos, ratos, cobras, os cristãos saberiam selecionar o que se considerava real “alimento”, a ser recebido “com ações de graça” (ver 1 Tim. 4:3), excluindo aquilo que a palavra de Deus proibia.

8 - Porque, sendo o corpo do cristão o “santuário do Espírito Santo” (1 Cor. 3:16, 17; 1 Cor. 9:18’), não deve contaminá-lo com aquilo que lhe seja prejudicial, já que devemos apresentar nossos corpos em “sacrifício vivo, santo e agradável a Deus”, que é o nosso “culto racional” (Rom. 12:1). Paulo também recomendou aos cristãos: “glorificai pois a Deus no vosso corpo” (1 Cor. 6:20).

9 - Porque Cristo e Pedro apresentaram comparações e ilustrações envolvendo porcos, num sentido de desprezo e depreciação de tal animal, tanto na linguagem de Cristo sobre “lançar pérolas aos porcos”, como ao mencionar porcos como um dos elementos da mais baixa degradação a que chegou o filho pródigo, e ao expulsar os demônios fazendo-os incorporarem numa manada de porcos; Pedro fala da porca que, lavada, volta ao lamaçal (ver Mat. 7.6; 8:30-32; Luc. 15:15, 16; 2 Ped. 2:22).

10 - Porque dados científicos confirmam o caráter malsão dos animais enumerados em Levítico 11 e Deuteronômio 14, como os chamados “frutos do mar”, porcos, peixes sem escamas, indicando a superioridade da legislação mosaica: Rudolph Virchow, conhecido como “o pai da patologia moderna”, disse:

“Moisés foi o maior higienista que o mundo já viu”. Dependendo de conhecimento revelado, e destituído de equipamento científico, Moisés ensinou, em seus pontos essenciais, quase todos os princípios de higiene praticados hoje. Entre eles encontramos a prevenção de doenças, desinfecção pelo fogo e pela água, controle epidêmico mediante denúncia e isolamento dos portadores de doenças contagiosas, seguida de completa desinfecção de todos os objetos possivelmente contaminados. O asseio pessoal era imposto e obrigatório o sistema de esgoto, de maneira que o arraial dos judeus era asseado como o são as cidades modernas. Conquanto se provesse exercício físico, impunham-se freqüentes períodos de descanso e relax para evitar o excesso de trabalho’“. -- Dr. Owen S. Parrett, Diseases of Food Animals, p. 7 (Southern Publishing Assn. Nashville, Ten., 1939).

Algumas considerações sobre as "Leis Dietéticas" do VT

Um Balanço dos Argumentos dos Adeptos do “Liberou Geral” Quanto às Regras Alimentares Bíblicas

* Qualquer discussão quanto às regras alimentares das Escrituras deve partir de três questões básicas que precisam ser bem definidas. Três perguntas apontam a isso, e são elas:

1 - Por que Deus criou essas leis de limitações alimentares? Teria Ele simplesmente “cismado” sobre certos tipos de carne, sem qualquer motivo justo, e pronto?

2 - Em que aspectos as leis dietéticas teriam sido abolidas na cruz, já que não eram cerimoniais? Em que apontariam ao sacrifício expiatório de Cristo?

Obs.: Houve quem sugerisse que simbolizariam a separação entre judeus e gentios. Mas se assim for, estaria Deus incluindo em Sua lei um aspecto de algo que Ele, que “não faz acepção de pessoas”, condena?

3 - Como o sangue derramado de Cristo teria sido eficaz para purificar a carne de porco, rato, urubu, cobras e lagartos? Teria operado alguma mudança de composição estrutural de modo a torná-las adequadas ao consumo humano?

Vejamos, a seguir, os principais argumentos levantados pelos “valetudistas alimentares” e como há dificuldades imensas para que tenham razão em suas alegações:


* Cristo em Marcos 7:1-23 fala do que entra pela boca não contaminar o homem, o que se interpreta como se Ele estivesse liberando Seus seguidores das regras alimentares:

Dificuldades de tal interpretação:

A - O contexto claramente indica que a discussão não era do conteúdo das leis dietéticas de Levítico 11 ou Deuteronômio 14, e sim o contraste entre o que Deus estipulou e o que a “tradição dos anciãos” determinava quanto a lavagens purificadoras cerimoniais (Mat. 15:2). Isso Ele mesmo confirma no vs. 20.

B - Se Jesus está “purificando” supostos alimentos imundos naquela refeição, Seu ato foi inútil porque tratava-se de uma refeição judaica, na qual não haveria carnes imundas.

C - Cristo estaria abolindo a lei de restrições alimentares ANTES DA HORA, pois as regras sobre alimentação não foram abolidas na cruz?

D - Cristo estaria ensinando algo contrário à lei divina “ainda” vigente, com o que teria que ser, Ele próprio, considerado “o mínimo no reino dos céus” à luz de Suas palavras em Mateus 5:19.


* O Concílio de Jerusalém, de Atos 15, é um episódio empregado por alguns para apresentarem a idéia de que os cristãos gentios estariam livres das limitações todas da “lei judaica”, interpretando isso especialmente como isentando-os da guarda do sábado e das leis alimentares.

Dificuldades de tal interpretação:

A - Querer limitar a expressão “lei de Moisés” (vs. 5) somente a alguns itens que não convenham ao investigador é desonesto (leis alimentares e sábado). Esta expressão é bem mais ampla e inclui os preceitos cerimoniais, como também os morais, como “não matarás”, “não furtarás”, “honra teu pai e a tua mãe”, “não dirás o nome de Deus em vão”. . . Esse uso discriminatório da expressão é inteiramente suspeita.

B - O que ficou determinado no Concílio é expresso em quatro itens de coisas de que os cristãos gentios deviam ABSTER-SE. Não se tratava de nenhuma listinha de coisas que deviam passar a praticar, em substituição à “lei mosaica”, como alguns pensam (um “Tetrálogo” a substituir o Decálogo?).

C - Das quatro regras estabelecidas, TRÊS tratam de. . . restrições alimentares! Então, em lugar de o Concílio de Jerusalém confirmar o “liberou geral” quanto às regras alimentares, instituiu foi algumas regras reiterando antigas restrições, aliás coisas da lei que supostamente havia sido abolida, como a proibição de ingerir sangue (Lev. 17:10-14). Como iriam repetir normas de uma lei abolida?!

D - Entre as reiterações de antigas normas há a recomendação contra os “pecados sexuais”, o que já era bem conhecido como lei divina, expressa no sétimo mandamento, “não adulterarás”. Contudo, os apóstolos acharam por bem reiterar tal princípio, possivelmente devido aos cultos pagãos envolverem prostitutas e prostitutos cultuais, e nem por isso a lei da qual essa regra é citada foi abolida.


* O episódio da visão do lençol de Pedro, narrada em Atos 10, em que aparece um lençol com todo tipo de animais imundos, acompanhada da ordem, “mata e come” é prova de que houve um “liberou geral” divino sobre as regras alimentares:

Dificuldades de tal interpretação:

A - A resistência de Pedro ante a ordem “mata e come” mostra que ele não aprendera com Jesus ou seus companheiros apostólicos que houve o “liberou geral” das leis de restrições alimentares.

B - Pedro não entendeu o sentido da visão de modo algum, pois manteve-se intrigado sobre a mesma (vs. 17), e que o seu sentido era inteiramente simbólico se percebe pelo simples fato de que seria impossível ao Apóstolo matar e comer o que via numa visão. Seria o mesmo que alguém tentar chupar um sorvete mostrado numa tela da TV.

C - Quando finalmente entendeu o sentido da visão, ele não a interpretou como tendo que ver com liberdade para comer de tudo, e sim que os gentios, dos quais aos judeus não era permitido “mesmo aproximar-se”, deviam ser contatados com o evangelho (ver vs. 28).

D - No capítulo seguinte, 11, ele diz que não poderia resistir à visão (vs. 17), mas tal resistência não dizia respeito a comer carnes imundas, e sim ao contato com os gentios. No seu discurso durante o Concílio de Jerusalém ele faz menção a sua experiência indiretamente, e fala em “purificação”, mas não de carnes imundas, e sim dos corações dos gentios conversos (ver Atos 15:7-9).

Que ele superou tal resistência fica claro em Gálatas 2:11, onde é dito que ele comia com os gentios, embora tenha recebido repreensão de Paulo pelo fato de tentar disfarçar esses seus contatos, injustificadamente.


* As leis de restrições alimentares eram cerimoniais, simbolizando a separação entre judeus e gentios, tendo cessado com a morte expiatória de Cristo:

Dificuldades de tal interpretação:

A - Os adeptos do “liberou geral” das leis alimentares não sabem definir as razões de Deus as ter instituído, para começo de conversa. Se fosse para proteger a saúde do povo, por que tal preocupação desapareceria da noite para o dia com a morte de Cristo, sendo que as condições de higiene do homem e animais permaneceriam as mesmas de séculos, não só na Terra de Judá, como por todo o mundo onde o evangelho seria pregado?

B - Não se justificaria que da noite para o dia carnes tais como de rato, urubus, cobras e lagartos passassem a ser consumidas, quando o véu do Templo rasgou-se de alto a baixo, e os vale-tudistas alimentares não sabem justificar por que a morte de Cristo teria alterado a composição dos alimentos imundos, e explicar como tais alimentos prejudiciais à saúde deixaram de sê-lo quando Cristo proferiu o “Está consumado” e expirou.

C - Não ocorre a mínima evidência de que realmente a alimentação com todo tipo de comida passou a ser a prática dos seguidores de Cristo dos primitivos anos do cristianismo, seja na Terra de Judá ou pelo resto do mundo.

D - Embora haja quem alegue que aquelas leis eram prefigurativas da separação entre judeus e gentios, o fato é que Deus não iria manter em Sua lei um aspecto tão negativo relativo a maus sentimentos humanos (preconceito racial, xenofobia), pois Ele “não faz acepção de pessoas”. Ademais, isso representaria mudar o enfoque de Cristo e Seu perfeito sacrifício para o homem em suas deficiências.


* Em Romanos 14 Paulo trata dos “fracos” em conflito com os “fortes” na fé, a respeito de certos artigos alimentares, dedicando-se a um debate em torno de se poder utilizar carnes outrora imundas, o que também se dá em 1 Tim. 4:1-3:

Dificuldades de tal interpretação:

A - Não há a mínima evidência de que os debates ali ultrapassassem a questão de alimentos sacrificados a ídolos, já que Paulo dissendia das decisões do Concílio de Jerusalém que proibiam tal consumo, enquanto dizia que “o ídolo em si nada é”, permitindo tal consumo, apenas recomendando respeito aos que tivessem escrúpulos delicados, para não melindrá-los com a licença de valerem-se de tais alimentos que, aliás, não se limitam a carnes (do grego broma).

B - A ênfase de Paulo quanto a nosso corpo ser “o templo do Espírito Santo” (1 Cor. 3:16, 17; 6:15) não favorece a noção de que o crente pode alimentar-se de carnes de porco, rato, urubus, cobras e lagartos, já que o mesmo Paulo disse: “Quer comais, quer bebais ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus” (1 Cor. 10:31). Com isso ele mostra que o cristão deve cuidar com o que come, e não ser indiferente ao tipo de comida que ingere.

C - O texto de discussão paralela em 1 Timóteo 4 fala em “abstinência de alimentos que Deus criou para serem recebidos, com ações de graça” (1 Tim. 4:3) e o seu contexto refere-se a quem até proibia o casamento, portanto numa referência a um grupo específico de pessoas, que os pesquisadores identificam como gnósticos de uma ala ascética. Logo, não se trata de uma regra geral, e de cara já temos que considerar que o “tudo o que Deus criou é bom” (vs. 4) deveria incluir também cobras, lagartos, baratas, aranhas. Além disso, excluiria os alimentos da “restrição alimentar” do Concílio de Jerusalém (Atos 15:20), com o que o “tudo” claramente tem suas limitações e não deve ser interpretado de modo absoluto.

D - Em 1 Tim. 4:5 Paulo fala de usar comidas que Deus criou e que são boas “porque pela palavra de Deus e pela oração são santificadas”. Sendo que a Palavra de Deus é citada como base para decisão de alimentos e esta estabelece as regras dietéticas (e a instrução bíblica que os cristãos primitivos na época recebiam era em grande medida por ouvirem a leitura das Escrituras aos sábados nas sinagogas--ver Atos 15:21) é extremamente improvável que o apóstolo esteja dando “carta branca” para o consumo de baratas, urubus, cobras e lagartos como sendo criados por Deus para consumo humano, milagrosamente transformados em alimentos aptos ao consumo humano apenas por causa de uma oração de graças (como alguns deixam implícito).


*O texto escatológico de Isaías 66:17 trata de profecias futuras, mas ligadas a Israel, e não a todos os moradores da Terra, pois há menção a nações ligadas à história e experiência de Israel como nação:

Dificuldades de tal interpretação:

A - Os capítulos 65 e 66 lidos na sua inteireza mostram o quadro de Deus apelando a Israel para ser-Lhe fiel e abandonar práticas condenáveis e abomináveis, diante da promessa de extermínio dos inimigos que os desviaram da verdade, e do novo céu e Nova Terra que se antecipam.

B - O contexto imediato da passagem fala de “fogo e espada” com que o Senhor entrará “em juízo COM TODA CARNE”, e que Ele vem para “ajuntar todas as nações e línguas” as quais “contemplarão a Minha glória”, numa claríssima indicação de tratar-se do mesmo fim descrito em Apocalipse. E “esses todos” que comem carne de porco, rato e praticam idolatria estão incluídos entre os condenados à destruição, tanto no capítulo 65 quanto 66 (ver Isa. 65: 3 e 4 e 66:16-18--ver também Eze. 33:25, nações pagãs condenadas por comerem carne com sangue).

C - Há descrições de nações contemporâneas do profeta (Társis, Pul, Lude, Tubal e Javã), mas são representativas das “todas as nações” mencionadas, bem como no Apocalipse o vidente de Patmos também trata de Babilônia, Egito, Gogue e Magogue representando TODOS os povos inimigos dos Filhos de Deus que encontrarão o seu castigo final.

D - No próprio final do capítulo há referência clara aos “novos céus” e “nova terra”, quando o povo de Deus estaria se mantendo fiel à lei divina, inclusive observando o sábado. No Novo Testamento também lemos de destruição aos que destroem o corpo, que é Templo do Espírito Santo (1 Cor. 3:17 e 6:19) e no Apocalipse João se refere às “aves imundas”, num contexto escatológico (ver Apo. 18:2). Destarte, pelo fim do 1o. século AD João ainda mantinha a concepção de animais imundos, prova de que tal atribuição a certos animais não havia cessado.